(Almargem do Bispo) Com os Carris da Recta

Concorro com a soberba recta férrea, Linha do Oeste, que tendo começado na abordagem à Estação do Sabugo só terminará abeirando as extintas pedreiras da Pedra Furada. Aos deslados, o montado da Morelena, maná de bolotas semeáveis, e a Serra de Olelas, furada de grutas cenobíticas.

Almargem do Bispo. Transponho os limites oficiosos da região de Lisboa. Oficiosos porque na prática parece que adentrei o Portugal rural. Pelas melhores e piores razões.

Numa sopeteada paragem, encho o bucho de amoras, oferecidas por silvas donas de si próprias. Doçura em troca de arranhões, quão feminino. Banqueteio-me. A Natureza tal como ela é, abundosa. Reitero, quão feminino. Coube o fruto silvestre por ser Verão. Prazeres gustativos. Fosse primavera e estaria cercado por orlas de papoilas e boninas, num tingido bravio de vermelho e amarelo, Prazeres visuais. Eis do melhor.

Resguardo-me com os choupos. Ai vem! Espanhola para os amigos, Camelo para as amigas, a Automotora da Série 592. Tosse um bafo a diesel, que não se leva tanto a mal, atendendo à graça do risco alvo-e-flavo inculcado à paisagem. Aceno ao maquinista. Responde com a buzina grave, paquidérmica.

Retomando e prosseguindo, perturba a secura dos campos calvos e pisos fracturados. Sistematicamente roçados para render ração aos bovinos que, por ironia do seu destino, aguardam em lista de espera a vez no matadouro. Soubessem os bois e as vacas, eles e elas, estarem em ceva para a matança, revoltar-se-iam? Lembra-me algo, colateral. Enfim... Executam-se os bichos e esteriliza-se a terra que também é viva. Respira, ri e chora, no seu ciclo de mortes e renascimentos, o próprio saṃsāra. Interrompe-se a regeneração da constituição do solo, desertificando. Daí as gretas raiadas que calco, na sequidão, a espaços. O Ser (des)Humano conseguiu, nesta conturbada fase da sua pré-adolescência evolutiva, a macabra proeza de assassinar a Alma das coisas. Veremos que Lições lhe darão os Antepassados, perplexos com a fealdade descoroçoada da sua descendência. As reprimendas profiláticas já foram pespegadas. Baldadas perante a contumácia da famigerada espécie que, orgulhosa, apenas responde perante o seu ego. Isso quer dizer que a próxima abordagem será atroante. Portanto, aprontem-se e debandem os capazes de antevisão, pois o edifício vai ser derruído aos caboucos e os escombros incineradas, para se garantir um recomeço de raiz. Eis do pior.

À vista, tenho Alfouvar com o cinematográfico Centro de Satélites de Sintra. São dezenas de antenas parabólicas, graúdas e miúdas, que competindo com as monoculturas de girassol, emprestam estímulo à imaginação. Estarão ali para estabelecer contacto com seres extraterrestres? Se for o caso, tratar-se-à de ignorância ou ingenuidade. Primeiro, são entidades interdimensionais, manes, pervagam todo o lado, subtilmente, e caber-nos-ia recuperar uma espécie de Esperanto Espiritual, para coloquiar, requisitar e receber ensinamentos. Segundo, e corolário, já trazemos antenas connosco, não carecendo adquirir e operar dispositivos externos para o efeito em causa.

Continuo. E como não tem de haver um móbil estabelecido para me mover, uma vez que sou Movido, continuo, simplesmente.


(Espanhola ou Camelo?, Jehoel)

 

   

(Secura Férrea, Jehoel)


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